sexta-feira, 31 de agosto de 2007

II

Nina Bebê

Era para ser um dia de luto, Nina Bebê não estava mais entre eles, mas ao invés de caixão e vela, fizeram festa, tocaram música, dirvertiram-se.

Não disseram adeus e sequer notaram sua ausência. A vida continuava a mesma para todos e substitutas para aquela criatura não faltariam, caso necessário, nas fases de crise.

Nina Bebê era conhecida na vizinhança, visitava a todos sem qualquer distinção e, nos momentos de carência, era muito bem recebida, com direito à afagos e carícias. Os carinhos, porém, no final do dia tornavam-se impossíveis e acabavam expulsando a pobre Nina de suas casas: homens de respeito não se deixam apegar à criaturas.

Se ela estivesse ali agora, deixaria todos os rapazes passarem a mão no seu rabo sem reclamar e, se duvidasse, ela mesma se esfregaria neles, alguns diriam descaradamente, outros inocentemente. A verdade é que ninguém nunca soube quais eram as reais intenções da Nina, nunca se atreveram a perguntar. Talvez, aquele olhar verde esmeralda os intimidasse ou talvez achassem que a pergunta seria complexa demais para haver resposta.

Independente de perguntas e respostas, Nina fazia o possível para cativar a todos, desde adultos até os garotinhos. Algumas mães não gostavam dela, principalmente quando viam-na agarrada aos seus filhinhos, temiam suas garras, chamavam-na de traiçoeira e, não se cansavam de insultá-la, ameaçá-la: “ Não fique muito perto dessa coisa, meu filho, isso não é de confiança, você nem sabe por onde ela passou. Eu já disse que se eu ver esse bicho de novo perto de você, eu mato... não você, ela.”

Na tentativa de se incluir na rua, Nina acabava sendo muitas vezes inconveniente. Aparecia sem ser convidada, pior, aparecia na hora do almoço. Trancaram portas, janelas e passaram a evitá-la cada vez mais. Já não bastava ser diferente, agora ela era excluída.

Pobre Nina Bebê, nem os seus lindos olhos de ressaca conseguiram melhorar sua reputação. Alguém, porém, aproximou-se de Nina, voluntariamente, conquistando em apenas alguns minutos a sua confiança, chamando-lhe de gatinha, prometendo-lhe comida e um lugar quentinho pra descansar em paz. Nina nem parou para pensar, entregou-se de corpo e alma à este cidadão. Seu corpo acabou parando numa churrasqueira, quentinha por sinal. Sua alma? Sua alma busca as outras seis vidas.

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